quarta-feira, 11 de junho de 2014


Vida normal 

para o jornalismo partidarizado no Brasil



Por Wellington Lucas[1]
O jornalista brasileiro Guilherme Fiuza, escrevinhador quinzenal da revista Época (Editora Globo), abordou com indignação ao que chamou de “visita clandestina” do governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz a José Dirceu na prisão da Papuda em Brasília, em artigo intitulado “Vida normal para a ex-quadrilha” publicado na edição N. 823 de 10/03/2014. A voraz argüição do jornalista (ou na melhor das hipóteses), expressão do senso crítico de cidadão, se voltou contra o governador da capital federal por ter “visitado clandestinamente na cadeia um criminoso, que por acaso é do seu partido, que por acaso foi condenado por corrupção, que....” e seguem as admoestações.

Sem pretender condenar o material editorial em si, qualquer um pode defender que está tudo certo quanto ao direito da tão sagrada liberdade de expressão em tempos de democracia estabelecida à duras penas, após quase 30 anos de censura. No entanto, fica evidente no artigo a oposição partidarizada da grande mídia (a qual abriga seus algozes mais refinados), numa abordagem requentada de sarcasmo, ironia e desprezo ao PT e ao governador do DF, o qual atribui o título de dublê de governador e cortesão de mensaleiro. Senão vejamos:

Ao decretar que um governador não pode ir a cadeia prestar solidariedade a um político condenado por corrupção, pois isso se configura um escândalo! Ao mesmo tempo, vai de encontro à falsa indignação que o jornalista registra, ao acusar o Brasil de inércia, pela Não reação da sociedade (neste caso, a mesma reação indignada que a sua), a visita governador ao ex-ministro, como se os fatos por si só, dessem cabo da ligação criminosa existente entre ambos e, deveria ser objeto imediato, inclusive por evocação popular, de novo inquérito no Supremo Tribunal Federal.

Não por acaso o jornalista reclama do povo brasileiro e das instituições dizendo: “Depois esse Brasil abobado e carnavalesco não sabe por que os companheiros representantes do povo pitam e bordam”. Na verdade, a alegórica abordagem busca apenas promover no imaginário dos leitores da revista a já conhecida aversão da elite nacional a conquista democrática pelo voto do maior partido de esquerda do Brasil há quase 12 anos. Porém, no dizer popular de Romário “Aí peixe” com uma imprensa dessas, fica fácil entender porque a Dilma e o PT podem atingir após 2014 um ciclo de poder contínuo que abrangerá 16 anos.

Para muito além do cidadão Kane, nos dias atuais, a nossa consagrada imprensa revela abertamente aquilo que o filósofo italiano Antônio Gramsci já havia previsto há mais de um século: que a imprensa se tornaria o braço político do capital (partido do capital). Talvez isso explique porque os governos democrático-populares de esquerda no Brasil são alvos das críticas mais mordazes da grande mídia.

Enquanto isso, os escândalos da Veja e sonegação milionária da Globo permanecem debaixo do tapete, na ante-sala dos grandes chefes editoriais Brasil afora. Já os mensaleiros levam normalmente suas vidas na cadeia, após condenação e prisão decretada pelo novo herói nacional, Joaquim Barbosa, sem direito ao trabalho e a visitas (qualquer um que o fizer pode ser associado à ex-quadrilha).

Tudo certo, não fosse o fato de apenas os políticos do PT, envolvidos no escândalo, estarem presos. Os demais membros da “ex-quadrilha” e, sobretudo, os parlamentares beneficiados pela suposta compra de voto pelo governo (os quais jamais foram acusados de nada), seguem normalmente suas vidas, intocáveis pela imprensa que se autodefine como séria e imparcial. Viva a imprensa e a verdade do domínio do fato, que o judiciário brasileiro consagrou.


[1] Wellington Lucas é servidor público, professor de História e Pós-graduado em Gestão Pública. wlucas@ufpa.br

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