domingo, 7 de julho de 2013

Brasil vai às ruas... por Wellington Lucas

Brasil vai às ruas: a sustentabilidade do atual modelo de sociedade em debate


Durante o mês de junho de 2013 as ruas de diversas cidades do Brasil se transformaram em expressão máxima da democracia no país, gerando as maiores manifestações de massa que se tinha notícia na história recente do Brasil (desde o impeachment do então presidente Fernando Color, em 1992). A onda de indignação dos jovens em diversas partes do mundo, da Primavera Àrabe, passando pela Europa, Estados Unidos e Chile finalmente chegou ao país que até então era considerado um “modelo” de desenvolvimento e estabilidade.

Este momento histórico vivenciado pela sociedade brasileira teve como combustível inicial, a luta pelo Passe Livre e/ou Tarifa Zero nos transportes públicos de duas das maiores capitais do Brasil, Porto Alegre e São Paulo. Neste último caso, em particular, o resultado mais emblemático foi muito bem descrito no artigo “Barramos: 15 anos em 15 dias” do site Passapalavra.info, logo após a revogação do aumento da tarifa dos transportes da cidade de São Paulo, anunciada em conjunto pelo governador do Estado, Geraldo Alkmin (PSDB) e o prefeito Fernando Haddad (PT) mostrando como foi possível o movimento social derrotar os dois principais partidos do país, PT e PSDB. Este episódio ficará marcado na história do país pela negação dos instrumentos de poder institucionalizados (Partidos, Poder Executivo, Legislativo, Judiciário, etc.), como únicos e exclusivos meios de transformações e/ou mudanças sociais, seja de curto, médio ou longo prazo. O clamor das ruas, sem dúvida, foi a maior expressão de soberania popular e democracia, pra além das instituições.

Sobre o Movimento Passe Livre, Transporte e Mobilidade Urbana, o Prof. Paulo Marques em artigo publicado no blog "A Batalha" afirma o seguinte:
"Cabe destacar que as mobilizações em torno da tarifa do transporte público não são novas, representam quase 10 anos de organização e ativismo de um movimento que em sua pauta estratégica do “Passe Livre” tem avançado na discussão sobre o como é possível pensar a estruturação da cidade em moldes mais democráticos. Ao levantar a bandeira da tarifa zero como horizonte de luta, o MPL ao mesmo tempo também questiona a própria lógica de privatização das cidades, no qual os trabalhadores são privados de acessos aos bens públicos. O movimento assim incide em uma discussão chave sobre os modelos de estruturação da sociedade como um todo."

E Conclui dizendo:
"Portanto, a luta pelo “Passe livre”, que foi o estopim da maior onda de protestos sociais dos últimos 20 anos é parte das reivindicações pela mobilidade urbana que soma-se às mobilizações de outros novos movimentos sociais que lutam contra as consequências desse modelo neo-desenvolvimentista que se esgota rapidamente, como a luta dos grevistas de Belo Monte, da luta quase sempre solitária dos indígenas, dos quilombolas, dos sem-terra e dos sem-teto, vitimas diretas do modelo que mantém intacta a profunda desigualdade social entre a massa de trabalhadores e a elite econômica e política."

Não obstante, hoje percebe-se que encerrada as primeiras manifestações em defesa de transporte público, gratuito e de qualidade (ora submetidos a  forte repressão policial do Estado e a criminalização deliberada da mídia nacional) a desão popular em massa que trouxe outras questões importantes da agenda decisória do Estado para o debate, a exemplo dos gastos públicos com saúde e educação, além de pautas específicas de setores da sociedade fortemente institucionalizados como MP (judiciário), a partir da derrubada do PL conhecido como PEC 37.

Parafraseando o sociólogo Paulo Marques, podemos dizer que, no momento, estamos presenciando a fase da polarização política das manifestações. Isto vem ocorrendo principalmente através de setores conservadores orientados pela mídia e partidos de direita que buscam aproveitar nos protesto, a oportunidade para incidir na agenda das mobilizações as suas pautas contra o governo federal, antecipando, portanto, a corrida eleitoral de 2014. Contudo, é importante destacar que podemos encontrar também nestas manifestações todo tipo de insatisfação de parcelas da juventude em relação as instituições e os partidos políticos, indicando a necessidade de uma ampla reforma do sistema político e eleitoral brasileiro. Mais isto é outro debate a ser travado dentro do arranjo político institucional atual, onde o governo, o congresso, os partidos políticos e os movimentos sociais se debruçarão antes mesmo do início do próximo semestre, cada um tentando impor sua visão ideológica e funcional sobre a reforma política e, o debate tende a se acirrar sobre a duas formas propostas de consulta popular: Plebiscito ou Referendo! Vamos assistir atentos mais esta batalha no cenário político-institucional e, observar, sobretudo, o lugar reservado a vozes das ruas neste episódio histórico que se avizinha.

Refletindo para além das manifestações podemos dizer que tudo isso demonstra que a enorme dívida social da democracia brasileira, que a curto prazo vem sendo reduzida pelos governos Lula/Dilma na última década, na verdade, a partir de uma análise histórica mais profunda e de longa duração, pode estar sendo apenas atenuada, e isto relacionam-se também com a crítica aos limites do sistema de representação política e o papel dos partidos políticos. Isto indica que, para desespero das elites conservadoras, dos militares, da mídia e do capital financeiro internacional (mercado), há lutas sociais mais profundas presentes nas manifestações que podem modificar todo o ordenamento político-institucional do Estado brasileiro.

Portanto, uma conclusão razoável pode ser encontrada nas palavras do Sociólogo Paulo Marques que diz: "não seria exagero afirmar que podemos estar presenciando um novo ciclo de ascensão das lutas sociais no Brasil. Lutas dos novos protagonistas que representam as classes exploradas pelo capital, que exigem, nada mais do que os direitos que lhes são negados. O novo ciclo de mobilizações sociais abrem também novas perspectivas para uma esquerda que não abandonou as lutas e as ruas em troca dos acarpetados tapetes do poder, abrindo assim novos horizontes à organização da luta anticapitalista no Brasil."

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